sexta-feira, 2 de outubro de 2015

Je ne parle pas français e outros contos (1920) 
Katherine Mansfield (1888-1923) - Nova Zelândia 
Tradução: Julieta Cupertino 
Rio de Janeiro: Revan, 1994, 131 páginas  




Esta coletânea reúne seis contos, entre eles duas verdadeiras obras-primas, "A casa de bonecas" e "Cenas". A arte de Katherine Mansfield é a da sutileza, o que lhe interessa é flagrar o momento exato em que subitamente compreendemos a essência da existência humana, o instante em que nossa vida sofre uma ruptura. Nunca é demais exaltar a impressionante capacidade da autora de trafegar com segurança entre mundos tão diversos, como a burguesia e o proletariado. Se em "A casa de bonecas" ela mostra como os códigos sociais se impõem para corromper a inocência da infância, em "Cenas" é aprofundado um tema recorrente em sua obra, a da trágica condição feminina num universo dominado por homens. Neste conto, magnífico, Mansfield explora a questão da sobrevivência pelo trabalho e expõe o corpo da mulher transformado em mercadoria. São também valiosas as narrativas "Na praia", um raro texto longo da autora, espécie de mosaico, e "A mosca", relato dos traumas provocados pela recente Grande Guerra (1914-1918)*. Uma curiosidade: em "Je ne parle pas français", a autora descreve a vida fútil de um jovem escritor, que entre seus livros possui um, intitulado "Moedas falsas". Em 1925, André Gide (1869-1951) publicaria "Os moedeiros falsos", um romance dentro de outro. 


Avaliação: MUITO BOM

(Outubro, 2015)


* Vale a pena comparar este conto com "A causa secreta", de Machado de Assis (1839-1908), publicado em Várias histórias (1896). Ambos têm como tema o sadismo. 


Entre aspas

"Acredito que as pessoas sejam como valises - fechadas, tendo dentro certas coisas, elas são expedidas, atiradas aqui e ali, empurradas a esmo, lançadas por terra, perdidas e achadas, de súbito semi-vazias ou atulhadas como nunca, até que o Carregador Final as joga no Derradeiro Trem e elas se vão, chacoalhando, para longe..." (p. 77)


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