segunda-feira, 24 de maio de 2021

 Viagens (1356-1357)

Jean de Mandeville (??-1372?) -  ??  

Tradução: Susani Silveira Lemos França     

Bauru: Edusc, 2007, 265 páginas



Um dos maiores sucessos editoriais dos século XIV, XV e XVI, dele existem mais de 250 manuscritos em diversas línguas, embora sobre o autor, de certo, pouco se saiba. Nascido na Inglaterra e morto em Liège (hoje, Bélgica), ele diz que o livro foi escrito em latim, "mas como a maior parte dos homens do meu país compreende melhor o francês que o latim, eu o escrevi em francês, e do francês passei ao inglês" (p. 36). O livro é um relato de viagens pelo mundo então conhecido: "E dado que muito tempo se passou sem nenhuma travessia para além-mar e muitos homens se deleitam em ouvir falar da Terra Santa e disso extraem mérito (...) eu (...) atravessei o mar no ano de 1322 (...) e a partir dessa data fiquei durante muito tempo no além-mar, vendo e visitando diversos lugares, províncias, reinos e ilhas. Passei pela Turquia, Armânia, a Pequena e a Grande, pela Tartária, Pérsia, Síria, Arábia, Egito, o Alto e o Baixo, pela Líbia, pela Caldéia, e por grande parte da Etiópia, pela Amazônia, pela Índia, a Menor e a Maior; passei por muitas ilhas que circundam a Índia, onde habitam diversos povos, com costumes, religiões e aparências diferentes" (p. 35). Nessas viagens, o autor demorou-se 34 anos, e regressou, "a contragosto, por causa de uma artrite gotosa". "Sempre obrigado a descansar, recordei o passado, compilei essas coisas e as coloquei por escrito, do modo que pude me lembrar" (p. 256). A questão toda é que muito provavelmente o autor nem tenha saído de casa para escrever o livro - ou que tenha, no máximo, se aventurado por uma pequena parte do território que ele descreve.  A grande maioria dos fatos narrados serve-se de relatos anteriores ou contemporâneos... Daí, talvez tenha sido, nesse sentido, o primeiro best-seller de ficção da história da literatura ocidental! Por isso, o livro é genial, pois o grande mérito do autor é exatamente o de dar vida, por meio de uma escrita clara e objetiva, a tudo que se conhecia em termos de conhecimento geral do mundo até aquele momento, tornando-se uma espécie de enciclopédia, que pode ser lida como compêndio ou como obra de imaginação. 


Avaliação: BOM

(Maio, 2021)


terça-feira, 11 de maio de 2021

Viagens (séc. XIII)

Marco Pollo (1254-1324) ditado a

Rustichello da Pisa (??-??) -  ITÁLIA  

Tradução: N. Meira, revisto por Jonas Pereira dos Santos    

São Paulo: Clube do Livro, 1989, 169 páginas



Este livro entra aqui como uma curiosidade, já que não se trata, a rigor, de uma narrativa de ficção. Mas, se isso é verdade, e é, também é verdade que naquele momento, século XIII, seria muito difícil separar o real e o imaginado, principalmente em se tratando do compêndio de uma viagem a regiões ignoradas pelo mundo ocidental, que Marco Polo conheceu. Ao longo de seus 26 anos de andanças pelo Oriente, mais exatamente pelas terras pertencentes ao Gran Khan mongol, Kublai (1215-1294), que governou absoluto por uma ampla região, que ia do Oceano Pacífico aos Montes Urais, da Sibéria ao Afeganistão, Marco Polo guardou lembranças vivas de povos, costumes e geografias, que possibilitaram uma descrição bastante próxima de um almanaque, pois acabaram servindo de fonte de inspiração para viagens comerciais posteriores. É impressionante a  quantidade de lugares explorados e é fascinante pensar que ele provavelmente tenha sido o primeiro - e por séculos um dos poucos - a avistar belezas naturais e construídas de um mundo tão distante para os europeus como hoje para nós é o espaço sideral. Diferentes comidas, diferentes faunas, diferentes tipos de pessoas com seus hábitos e religiões, diferentes climas, diferentes cultivos, diferentes culturas, diferentes meios de transporte e de comércios, nada escapou aos olhos observadores de Marco Polo. E lê-se, e isso talvez devamos ao compilador da narrativa, como um romance de aventuras...


Avaliação: BOM

(Maio, 2021)



domingo, 2 de maio de 2021

 A viagem de São Brandão (século X)

Benedeit (século XII) -  INGLATERRA*  

Tradução: José Domingos Morais   

Lisboa: Assírio & Alvim, 2005, 93 páginas


Trata-se de uma fábula que é, ao mesmo tempo, aventura e devoção. Existiu no século VI um monge irlandês de nome Brenian ou Brendam (traduzido como Brandão) que, junto com outros catorze monges, se aventurou pelo oceano desconhecido, rumo ao ocidente, em busca do Paraíso descrito na Terra. O texto que serve de base para esta tradução, do século XII, é apenas um dos inúmeros manuscritos que começaram a circular pela Europa  a partir do século X. Escrito em forma de poema narrativo, o texto é um poderoso repertório de imagens fantásticas e uma mostra do desejo dos europeus de tentar descobrir o que havia para além das terras conhecidas. São Brandão e seus discípulos, guiados pela fé em Deus, lançam-se ao mar e esbarram com seres míticos, como a ilha que na verdade era uma baleia; com uma imensa serpente marítima que é combatida e morta por outra serpente marítima; com grifos; e com pássaros falantes que são anjos. Eles descobrem o inferno - que, na verdade são dois, o quente e o gelado - e se deparam com Judas, eternamente amarrado a um rochedo, fustigado por demônios, sofrendo as penas dos dois infernos. E alcançam afinal do Paraíso, sendo que São Brandão foi o único ser humano que teve o privilégio de lá estar sem ter morrido. Após alguns anos, ele volta para casa, onde ainda vive por largo tempo até voltar ao Paraíso, agora em definitivo. As referências evocam desde óbvios textos bíblicos até tragédias gregas, imaginário oriental e circunstâncias contemporâneas.


* Inglaterra aqui é apenas uma referência geográfica. O país ainda não estava constituído e o manuscrito do livro em questão foi escrito em anglo-normando, uma língua latina muito mais próxima do francês do que do inglês. 


Avaliação: BOM

(Maio, 2021)