terça-feira, 23 de fevereiro de 2021

 Noturno indiano (1984)

Antonio Tabucchi (1943-2012) -  ITÁLIA  

Tradutor: Wander Melo Miranda  

Rio de Janeiro: Rocco, 1991, 98 páginas



Essa novela é uma preciosidade. O narrador encontra-se na Índia com o objetivo de procurar um amigo português, chamado Xavier, que teria se perdido naquele país onde é fácil se perder. Ele então começa a seguir pistas bastante tênues, e, de informação vaga em informação vaga, frequenta um hotel barato e altamente suspeito em Bombaim, onde uma prostituta fornece um outro endereço em que talvez o amigo esteja. O narrador empreende uma busca, que não é obsessiva, na verdade é quase uma vontade de não encontrar, percorrendo hotéis de luxo - como o Taj Mahal, ainda em Bombaim, o Taj Coromandel, em Madras -; parando em conexões rodoviárias no meio do nada, onde um arhant, profeta jainista (um ser humano que alguma doença transformou em uma monstruosidade) lhe diz que ele é outro; visitando a sede de uma sociedade teosófica em Madras e uma biblioteca católica em Goa, onde, finalmente instalado num hotel de luxo, conhece uma fotógrafa a quem confia que está escrevendo um livro cujo protagonista é um sujeito que vai à Índia em busca de um amigo, mas que na verdade esse amigo é ele mesmo, "alguém que não quer se deixar encontrar" (p. 92). Uma narrativa movediça, na qual nos conduzimos como naquelas noites de cerração baixa, que parecem sonhos, mas que são pesadelos...


 Curiosidade:

Em um diálogo, as páginas 36 e 37, o narrador conversa com um jainista na gare da Victoria Station, em Bombaim. O janista fala: 

- O que fazemos dentro destes corpos (...)

O narrador comenta:

- Talvez viajemos dentro deles.

O jainista pergunta:

- Como disse?

O narrador responde:

- Referia-me aos corpos. Talvez sejam como malas, nos transportamos a nós mesmos.

Curiosamente, essa ideia está presente em Katherine Mansfield (Je ne parle pas français e outros contos, de 1920, aqui resenhado em postagem do 2 de outubro de 2015):

"Acredito que as pessoas sejam como valises - fechadas, tendo dentro certas coisas, elas são expedidas, atiradas aqui e ali, empurradas a esmo, lançadas por terra, perdidas e achadas, de súbito semi-vazias ou atulhadas como nunca, até que o Carregador Final as joga no Derradeiro Trem e elas se vão, chacoalhando, para longe..." (p. 77)


Avaliação: MUITO BOM

(Fevereiro, 2021)

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