segunda-feira, 8 de fevereiro de 2021

Contos

Voltaire (1694-1778) -  FRANÇA  

Tradutor: Mário Quintana  

São Paulo: Abril Cultural, 1972, 672 páginas





Embora intitule-se Contos, esse volume deveria intitular-se Contos e novelas, pois é do que se trata. A obra reúne 25 textos, desde brevíssimas narrativas, como "Os dois consolados", que compreende apenas duas páginas, até "Cândido, ou O Otimismo", que avança por 90 páginas, e que encontram-se submetidos a uma mesma premissa formal, a da alegoria filosófica. Se não foi Voltaire quem inventou o gênero - ele é herdeiro das fábulas morais que se conhecem desde a Alta Antiguidade -, certamente ampliou suas possibilidades. Voltaire usa e abusa do que hoje se chama intertextualidade, do que hoje se pratica como falsa autoria, para expor suas considerações a respeito dos males de sua época, particularmente de sua ojeriza aos desmandos da Igreja Católica, com sua hipocrisia, corrupção e apego ao poder temporal, atrelado à manutenção das massas em profunda ignorância. Para isso, ele genialmente parodia todos, ou quase todos os gêneros romanescos em voga: as narrativas orientais ("Zadig, ou O destino"), o romance picaresco ("História das viagens de Scarmentado - escrita por ele próprio"), a sátira ("Cândido, ou O otimismo"), o conto com fundo moral ("Jeannot e Colin"), o romance indigenista ("O Ingênuo, história verdadeira, tirada dos manuscritos do Padre Quesnel"), a crítica de costumes ("O homem dos quarenta escudos", onde, aliás, cita, modernamente, o seu "Cândido", à pagina 403), as narrativas de viagens ("A princesa de Babilônia"), o romance epistolográfico ("As cartas de Amabed, etc - traduzidas pelo padre Tamponet") e até mesmo antecipa as narrativas de ficção científica "Micrômegas - história filosófica"). Uma injeção de inteligência, de erudição, de bom humor e, principalmente, de capacidade crítica. Saímos do volume iluminados.


Entre aspas:

"Os mais implacáveis ódios não têm comumente raízes mais importantes" (pág. 25)

"Considere que os fanáticos são mais perigosos do que os velhacos. Jamais se convence um energúmeno; a um velhaco, sim" (pág. 282)

"(...) os homens são supersticiosos por costume e velhacos por instinto" (pág. 291)

"A leitura eleva a alma, e um amigo esclarecido a consola" (pág. 331)

"Muitos bons burgueses, muitas grandes cabeças, que se julgam boas cabeças, dizem, com ar importante, que os livros não servem para nada. Mas não sabem, esses vândalos, que não são governados a não ser por livros? Não sabem que o código civil, o código militar e os Evangelhos são livros dos quais dependem continuamente" (pág. 402)


Avaliação: MUITO BOM

(Fevereiro, 2021)



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