segunda-feira, 18 de janeiro de 2021

 Thérèse Desqueyroux (1927)

François Mauriac (1885-1970) -  FRANÇA  

Tradutor: Carlos Drummond de Andrade  

São Paulo: Cosac & Naify, 2002, 187 páginas



Thérèse Désqueyroux - em solteira, Thérèse Larroque - é formalmente inocentada de uma grave acusação: ter tentado envenenar o marido. Para isso, foi fundamental o depoimento favorável da própria vítima, Bernardo, um sujeito insípido, com quem tem uma filha, Maria. Mas alguns sabem que Thérèse é realmente culpada - sua família, a família de Bernardo, os médicos que trataram Bernardo - e todos na pequena cidade onde vivem, Saint Clair, desconfiam da verdade. Porém, para salvar as aparências, afinal trata-se de burgueses donos de vastas terras numa região quase selvagem perto de Bordeaux, Bernardo traça um plano que fará cumprir à risca. Primeiro, inocenta a mulher. Depois, leva a filha para ser criada longe de Thérèse, a quem praticamente encarcera na casa de campo, na minúscula aldeia de Argelouse, até o casamento por interesse da meia-irmã, Anna de la Trave. Quando se dissipam as dúvidas a respeito da elevada moral do casal, ele leva Thérèse para uma espécie de asilo em Paris, onde ela deverá viver o resto de sua vida, sem contato com o marido, a filha e os familiares. Thérèse é uma personagem intrigante - dona de uma sensualidade latente, e reprimida, como demonstram seu interesse pela cunhada, por Jean Azevedo, um estudante que passa férias na aldeia e por quem Anna inicialmente se apaixona, pelo padre de Saint Clair. Sufocada pelo clima da província, Thérèse é uma mulher com aguda curiosidade intelectual e que encontra à sua volta apenas mediocridade e convencionalismo - e, nisso, lembra muito Emma Bovary, protagonista de Madame Bovary (1857), de Gustave Flaubert (1821-1880)*. A diferença fundamental é que, enquanto Emma Bovary se mata - com arsênico, o mesmo veneno que Thérèse usa para tentar assassinar o marido -, Thérèse tem a possibilidade de recomeçar a sua vida em liberdade. O ponto alto do livro é a compreensão de que a tentativa de homicídio de Thérèse é um ato gratuito - aquele ato gratuito de quem fala o escritor russo Fiódor Dostoiévski (1821-1881).


* O Autor dá uma dica sutil da filiação de Thérèse Desqueyroux a Emma Bovary, quando, à pagina 40, escreve: "Ana era quem primeiro se espreguiçava, impaciente para matar calhandras ao entardecer. Teresa, que detestava esse divertimento, seguia-a entretanto. insaciável de sua presença. Ana apanhava no vestíbulo a espingarda Flaubert, que não dá coice".


Entre aspas:

"Nada é realmente grave para os seres incapazes de amor" (pág. 110)


Avaliação: BOM

(Janeiro, 2021)




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