terça-feira, 21 de abril de 2020

A Praça do Diamante (1962)
Mercè Rodoreda (1908-1983) ESPANHA      
Tradução: Luis Reyes Gil            
São Paulo: Planeta, 2019, 253 páginas





Escrito em catalão, esse romance narra a comovente trajetória de Natàlia, apelidada de Colometa, vivendo os atribulados anos 1930 e 1940 em Barcelona. Jovem, Natàlia conhece o impetuoso Quimet na Praça do Diamante, num dia de festas, e, de tanto ele insistir em namorá-la, ela acaba desmanchando seu noivado com o cozinheiro Pere. Colometa e o marceneiro Quimet iniciam então uma relação conturbada, mas intensa, que rapidamente desemboca em casamento e dois filhos, Antoni (Toni) e Rita. Machista, egocêntrico e imaturo, Quimet alimenta quimeras - compra uma motocicleta e enche o apartamento de pombos, com a venda dos quais imagina ganhar dinheiro, o que nunca acontece. O casal vive rodeado pelos amigos de Quimet, Cintet e Mateu, enquanto Natàlia tem em dona Enriqueta uma espécie de refúgio materno. Para auxiliar no orçamento doméstico, Natàlia emprega-se na casa de uma família burguesa, e assim o casal vai levando uma vida que, se não é de fartura, também não é de miséria. Até que explodem os conflitos da Guerra Civil, que opôs republicanos, comunistas e anarquistas aos fascistas e monarquistas. Os amigos Quimet, Cintet e Mateu aderem aos anti-fascistas e seguem para o front. Natàlia é demitida, por seu marido estar envolvido com os inimigos de seus patrões, e sua vida sofre uma brusca transformação. Convivendo com a falta dinheiro, as privações rondam sua casa: "Passamos uma época tão triste que nem dá para explicar: a gente ia cedo para a cama para não perceber tanto que não havia janta. No domingo não levantávamos cedo para não sentir tanta fome" (p. 159). Então, um dia recebe a notícia de que Quimet havia morrido em combate - assim como seu amigo Cintet, enquanto Mateu é fuzilado pelos fascistas. As coisas pioram bastante e, sem perspectivas, Natàlia resolve se matar e matar os filhos: "(...) a gente não fazia nenhum mal a ninguém e não tinha ninguém que gostasse da gente" (p. 173), constata, com profunda amargura. Ela decide então comprar uma garrafa de ácido nítrico, mas acaba recebendo uma proposta de trabalho do merceeiro, também chamado Antoni. Após alguns meses convivendo com ele - cuidando de sua casa -, Antoni a pede em casamento, explicando que, como era um mutilado de guerra - "(...) sou inútil aqui no meio" (p. 196) -, assumiria a família como sua. E assim ocorre:  Natàlia une-se a ele, que oferece a todos o seu melhor, em termos afetivos e financeiros. O tempo passa, Natàlia vê Rita se casar e Toni prestar o serviço militar. A cena final é uma das mais lindas da literatura mundial: Natàlia se dirige ao antigo apartamento, grava seu nome na porta de madeira, pondo um ponto final naquela vida anterior, e assumindo de vez o amor por Antoni, por quem, até então, conseguira ser apenas grata. "Tive que me fazer de cortiça para poder seguir em frente, porque se em vez de ser de cortiça com coração de neve tivesse continuado como antes, de carne que dói quando a gente belisca, não teria conseguido atravessar uma ponte tão alta e tão estreita e tão comprida" (p. 164). Belíssima história, narrada na primeira pessoa, que, numa simbiose perfeita, mostra como as trajetórias pessoal e coletiva necessariamente se imbricam. 



 Avaliação: OBRA-PRIMA


(Abril, 2020)

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