terça-feira, 5 de dezembro de 2017

47 contos 
Isaac Bashevis Singer (1904-1991) - POLÔNIA 
Tradução: José Rubens Siqueira 
 São Paulo: Cia das Letras, 2004, 719 páginas





Esta antologia recolhe boa parte dos contos, escritos originalmente em iídiche, vertidos para o inglês, com supervisão do Autor. Em geral, as histórias envolvem judeus hassídicos vivendo em pequenas comunidades miseráveis da Polônia antes da II Guerra Mundial, ou espalhados pelo mundo, particularmente nos Estados Unidos (Nova York e Miami) após 1945. As narrativas são formalmente tradicionais - "causos" - e encontram-se mergulhadas num universo fantástico, principalmente as que se passam nas aldeias polonesas, mas não no fantástico onírico que caracteriza o realismo mágico latino-americano, mas no fantástico enraizado nas superstições, onde demônios, reencarnação, metempsicose, possessões diabólicas, esconjuros e feitiços são reais. Aliás, a presença do Mal travestido de Bem para enganar até mesmo o mais crente dos crentes é um dos temas recorrentes do livro - aparece em textos como "O cavalheiro da Cracóvia", "O invisível", "A destruição de Kreshev","O último demônio", "O violinista morto", "Tem alguma coisa lá", "Uma coroa de penas", entre outros. Temas recorrentes também são histórias de amor impossível - "O Spinoza da rua do Mercado", "Yentl, o menino da yeshiva", "A viagem astral" - e as experiências de um escritor iniciante - "Um amigo de Kafka", "Um dia em Coney Island", "Fuga da civilização", "Vanvild Kava". Eu destacaria pelo menos cinco obras-primas: "Breve sexta-feira", "A sessão espírita", "Avô e neto", "O manuscrito" e "O escritor de cartas". Imiscuem-se em todos os contos a solidão, o sexo, o sonho, os desencontros, a paranoia (impressionante em "A cafeteria"), os traumas advindos dos pogroms. Um exemplo perfeito de que literatura é transcendência - não importa sobre o quê está se falando, mas como se está falando. Escrevendo em iídiche (uma língua em extinção), tendo como cenário aldeias miseráveis habitadas por judeus hassídicos "mergulhados em fanatismo, superstição, trevas" (p. 553) e como tema usos e costumes específicos, o Autor consegue sondar o mais recôndito da alma do Ser Humano. 



(Dezembro, 2017)



Avaliação: MUITO BOM  



Curiosidade:

O Brasil aparece em três momentos no livro:
pág. 241: "Os refugiados com que se encontrava espalhavam toda sorte de boatos sobre vistos para aqueles que haviam ficado na Europa, pacotes de comida e medicamentos que lhes seriam mandados por diversos agentes, formas de trazer os parentes da Polônia via Honduras, Cuba, Brasil". ("A sessão espírita")
pág. 532: "Disse: 'Gosto de café doce, não amargo. No Rio de Janeiro bebem xícaras minúsculas de café amargo feito bile". ("Uma história de duas irmãs")
pág. 685: "Margit foi criada pela irmã do pai, que era amante de um brasileiro dono de uma plantação de café". ("Vizinhos")



Entre aspas:

"(...) a compaixão é uma forma de amor e, de fato, a sua maior expressão". (pág. 536)






Nenhum comentário:

Postar um comentário

Observação: somente um membro deste blog pode postar um comentário.