segunda-feira, 16 de janeiro de 2017

O risco do bordado (1970)
Autran Dourado (1926-2012) - BRASIL
Rio de Janeiro: Rocco, 1999, 221 páginas






Dividido em sete partes (ou blocos) que podem ser lidos de forma independente, este romance narra episódios da adolescência de João da Fonseca Nogueira em Duas Pontes, pequena cidade imaginária do interior de Minas Gerais. Cada bloco expõe uma experiência essencial da vida do personagem: “Viagem à Casa da Ponte” é a descoberta da sexualidade (mas também da culpa religiosa), a paixão platônica pela prostituta Teresinha Virado; “Nas vascas da morte” tem como fulcro o falecimento do tio-avô Maximino, quando aparecem, sutilmente, as brigas da família; “Valente Valentina”, o amor, que ainda não é o verdadeiro, concebido com mácula e remorso; “As voltas do filho pródigo” evidencia a arrebatadora figura do tio Zózimo, que de tempos em tempos some e ressurge na casa dos pais e que carrega um terrível e subterrâneo sofrimento; “Assunto de família” regressa aos tempos do bisavô, Zé Mariano, que após construir uma fortuna com a Fazenda do Carapina, larga a mulher, dona Pequetita, e vai se refugiar no Sítio da Barra, que legou a um filho natural, pardo, Valdomiro, tido com uma agregada ainda antes de se casar; “O salto do touro” descreve a atração física pela tia Margarida, irmã da mãe, estranha mistura de erotismo e culpa, que termina de forma patética (e trágica); “As roupas do homem”, dividido por sua vez em quatro trechos, narra a história do fascinante Xambá, bandido cruel e ao mesmo tempo ingênuo – e coloca em cena o outro tio, Alfredo, estudante de Agronomia em Viçosa, arrogante, briguento e mulherengo. O adolescente João vive mais na casa do avô Tomé e da avó Naninha que em sua própria e é notável a pouca importância que tem em sua vida a mãe, Gilda, e a ausência do pai, “(...) sempre viajando para São Paulo e Rio de Janeiro, metido em muitos negócios (...)” (p. 66), mas incapaz de manter financeiramente a família. A composição deste romance é primorosa: embora sem encadeamento, os blocos vão pouco a pouco explicitando a derrocada de uma família da aristocracia rural com seus segredos e interditos, deixando imensas lacunas, já que só “(...) Deus é que sabe por inteiro o risco do bordado” (p. 193).


(Janeiro, 2017)

Avaliação: MUITO BOM 

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