quarta-feira, 6 de janeiro de 2016

Memórias póstumas de Brás Cubas (1881) 
Machado de Assis (1839-1908) - Brasil             
Rio de Janeiro: Civilização Brasileira; Brasília: MEC, 1975, 301 páginas 






Um dos melhores romances da literatura ocidental, “(...) livro escrito com pachorra, (...) que não edifica nem destrói, não inflama nem regela (...) mais que passatempo e menos do que apostolado” (p. 104). Morto, Brás Cubas pode mostrar-se como é, sem receio do julgamento de seus pares: egoísta, interesseiro, parasita social que usufrui da fortuna deixada pelo pai. Se do ponto de vista formal é inovador e moderno basta observar, por exemplo, os capítulos VI (O delírio), digno de figurar nas melhores antologias fantásticas; o magnífico LV (O velho diálogo de Adão e Eva), inteiro construído com interrogações, exclamações e reticências; o CXXXIX (De como não fui ministro de Estado), feito somente com reticências, pois “há coisas que melhor se dizem calando” (p.281) não o é menos na introdução de novas temáticas no horizonte da ficção nacional. Escrito com “a pena da galhofa e a tinta da melancolia” (p. 97), é irônico, pessimista, cruel observe, entre outros, os capítulos XXI (O almocreve), o XLVI (A herança), o LXVIII (O vergalho) e o LXXV (Comigo). Interessante também notar que destas Memórias surgem algumas sugestões para textos posteriores, particularmente o romance Quincas Borba (1892)*.

* É aqui que surge o personagem e aqui também que é exposta sua filosofia, o Humanitismo (cap. CXVII). 



Avaliação: OBRA-PRIMA 

(Janeiro, 2016)


PRIMEIRO PARÁGRAFO

“Que Stendhal confessasse haver escrito um de seus livros para cem leitores, coisa é que admira e consterna. O que não admira nem provavelmente consternará é se este outro livro não tiver os cem leitores de Stendhal, nem cinquenta, nem vinte, e quando muito, dez. Dez? Talvez cinco. Trata-se, na verdade, de uma obra difusa, na qual eu, Brás Cubas, se adotei a forma livre de um Sterne, ou de um Xavier de Maistre, não sei se lhe meti algumas rabugens de pessimismo. Pode ser. Obra de finado. Escrevi-a com a pena da galhofa e a tinta da melancolia, e não é difícil antever o que poderá sair desse conúbio. Acresce que a gente grave achará no livro umas aparências de puro romance, ao passo que a gente frívola não achará nele o seu romance usual; ei-lo aí fica privado da estima dos graves e do amor dos frívolos, que são as duas colunas máximas da opinião".


ÚLTIMO PARÁGRAFO

“Este último capítulo é todo de negativas. Não alcancei a celebridade do emplasto, não fui ministro, não fui califa, não conheci o casamento. Verdade é que, ao lado dessas faltas, coube-me a boa fortuna de não comprar o pão com o suor do meu rosto. Mais; não padeci a morte de Dona Plácida, nem a semi-demência do Quincas Borba. Somadas umas coisas e outras, qualquer pessoa imaginará que não houve míngua nem sobra, e conseguintemente que saí quite com a vida. E imaginará mal; porque ao chegar a este outro lado do mistério, achei-me com um pequeno saldo, que é a derradeira negativa deste capítulo de negativas: - Não tive filhos, não transmiti a nenhuma criatura o legado da nossa miséria”. 


Entre aspas

“Não importa ao tempo o minuto que passa, mas o minuto que vem. O minuto que vem é forte, jocundo, supõe trazer em si a eternidade, e traz a morte, e perece como o outro, mas o tempo subsiste”. (p. 111)

“Marcela amou-me durante quinze meses e onze contos de réis, nada menos”. (p. 132)

“Deixa lá dizer Pascal que o homem é um caniço pensante. Não é; é uma errata pensante, isso sim. Cada estação da vida é uma edição, que corrige a anterior, e que será corrigida também, até a edição definitiva, que o editor dá de graça aos vermes” (p. 152)

“A velhice ridícula é, porventura, a mais triste e derradeira surpresa da natureza humana (p. 222)



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