segunda-feira, 7 de janeiro de 2019

Sargento Getúlio (1971)
João Ubaldo Ribeiro (1941-2014BRASIL 
Rio de Janeiro: Civilização Brasileira, 1971, 108 páginas


O sargento Getúlio dos Santos Bezerra, idade indefinida - "(...) devo ter mais de trinta. Devo ter mais de quarenta" (p. 62) -, é encarregado de levar o desafeto de um político ligado ao PSD sergipano - um "comunista (...) maricão estrumado (...) capadócio (...) udenista" (p. 14), em sua confusa acepção -, desde Paulo Afonso, na Bahia, até Aracaju. O sargento Getúlio e seu companheiro, Amaro, que dirige o Hudson da PM de Sergipe, estão desempenhando bem seu papel, até que as coisas mudam, "a política entrou pelos contrários" (p. 45). Desconfiado, o sargento Getúlio resolve não aceitar a contraordem de entregar o prisioneiro aos colegas - "O que eu não entendo eu não gosto, me canso" (p. 63) - e se homizia numa fazenda, depois na casa paroquial de um padre-jagunço, e mais tarde na casa de uma amante, Luzinete, sempre provocando escaramuças contra os seus agora inimigos. Até que, morto Amaro, o sargento Getúlio, modificado pelos acontecimentos - "eu era ele, agora eu sou eu" (p. 104) - se prepara para o enfrentamento final em Barra dos Coqueiros, bem em frente a Aracaju. Além de o protagonista ser um personagem inesquecível em sua quase animalesca existência - ele se considera "político":  "não mato à toa" (p. 11) -, o grande mérito do livro está na linguagem, que, embora claramente inspirada em Guimarães Rosa (1908-1967) - "Sergipe é um sertão só, mesmo que não seja" (p. 13) -, consegue uma surpreendente singularidade, o que não é pouco... O romance é um longo monólogo no qual o sargento Getúlio conta a um interlocutor passivo - como em Grande sertão: veredas (1956) -  suas proezas, quase sempre ligadas a assassinatos crudelíssimos, incluindo o de sua mulher grávida, que ele desconfia o tenha traído: "A mulher recebe o caldo do outro. Que fica lá dentro, se mistura com ela. Então não é a mesma mulher" (p. 21). Retrato da política brasileira, no caso um flagrante do nordeste na década de 1950, tema praticamente ausente da nossa literatura.


Avaliação: MUITO BOM


 (Janeiro, 2019)

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