domingo, 23 de abril de 2017

A ponte sobre o Drina (1945)
Ivo Andric (1892-1975) - BÓSNIA    
Tradução: Lúcia e Dejan Stankovic      
Lisboa: Cavalo de Ferro, 2016, 384 páginas



Magnífica reconstrução da conturbada história da Europa (e de sua extensão, o Oriente Médio), por meio da crônica de acontecimentos ordinários ocorridos às margens do rio Drina - mais precisamente, à cabeceira da ponte que se ergue majestosa sobre ele, em terras onde os mundos cristão e muçulmano se confundem, a Bósnia. O Autor deixa de lado os heróis e anti-heróis para se dedicar aos anônimos habitantes de Visegrad, que ao longo de quase 400 anos observam, na maior parte do tempo passivamente, a História desfilar à sua porta. O livro começa na segunda década do século XVI com a edificação da ponte de pedra - cerca de 200 metros de comprimento e oito de largura - pelo grão-vizir Mehmed Paxá, uma espécie de primeiro-ministro do Império Otomano, nascido nas imediações e convertido à força aos 10 anos. Enfiados em suas casas de comércio, os membros das comunidades muçulmana, cristã ortodoxa e judaica vivem em harmonia, mas sujeitas a decisões políticas tomadas longe dali, que acabam repercutindo, às vezes com mais, às vezes com menos intensidade, em seu cotidiano. Situada na fronteira com a Sérvia, os moradores de Visegrad conhecem tempos de fartura e de paz, mas também de crise e de guerra. As lembranças incluem grandes inundações, casamentos memoráveis, bêbados que caminharam pelos arcos da ponte, batizados atrasados por festas, amores frustrados, amizades frustradas, vidas frustradas. E conflitos: as rebeliões da população sérvia; o começo do desmantelamento do Império Otomano, em meados do século XIX, quando a região torna-se protetorado do Império Autro-Húngaro; a anexação pelo Império Autro-Húngaro, em 1908; e, finalmente, o atentado contra o arquiduque Francisco Ferdinando, em Sarajevo, capital bósnia, em 1914, que dá início à Primeira Guerra Mundial, a mais terrível de todas as guerras. O romance termina justo aqui, nos primeiros meses da conflagração que causou a morte de milhões de jovens, que o Autor assim brilhantemente sintetiza: "O que a caracterizava particularmente é que há muito tempo não surgia uma geração que tivesse sonhado mais com a vida e da vida falado mais e com mais audácia, bem como dos prazeres e da liberdade, e que, ao mesmo tempo, tão pouco tivesse recebido da vida, mais tivesse sofrido, mais fosse escravizada, morrendo pelos seus ideais" (p. 280).
     

(Abril, 2017)




Observações:

1) Não compreendo a capa deste livro: a personagem principal e única é a ponte que empresta o título ao volume, e a figura que a ilustra leva-nos, erroneamente, a imaginar que é uma história sobre um líder turco ou, no máximo, sobre o Império Otomano...  

2) Entre as páginas 39 e 52, há uma descrição impressionante da tortura e empalamento, pelos turcos, de um cristão ortodoxo que tentou sabotar a construção da ponte. 


Avaliação: MUITO BOM      



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