terça-feira, 22 de novembro de 2016

Os ratos (1935) 
Dyonélio Machado (1895-1995) - Brasil         
São Paulo: Planeta, 2004, 207 páginas




Um dos melhores romances da literatura brasileira, acompanha 24 horas na vida do pequeno funcionário público Naziazeno Barbosa, homem apático, acuado pela pobreza, dono de uma "preguiça doentia" (p. 53), que tenta arrumar dinheiro para quitar sua dívida com o leiteiro, sob pena de este deixar de fornecer o produto, essencial para o filho "de quase quatro anos" (p.147). Naziazeno consome toda a manhã e a tarde percorrendo as ruas do centro de Porto Alegre na esperança de encontrar alguém - um colega, um agiota - que lhe empreste o dinheiro necessário. Covarde e sem carisma, ele hesita, ele titubeia, ele vacila. No meio da tarde, consegue uma modesta quantia com um conhecido e resolve testar a sorte na roleta, sem sucesso. Somente no começo da noite, com ajuda de dois notórios malandros, Alcides e Duque, é que consegue o dinheiro, por meio do empenho do anel de bacharel de um deles a um tal doutor Mondina. Satisfeito, Naziazeno chega em casa às nove horas da noite, levando queijo, manteiga, um brinquedinho para o filho e o montante da dívida. Ele coloca então as notas em cima da mesa da cozinha para que, na madrugada, o leiteiro as recolha. No entanto, ansioso, Naziazeno imagina, desesperado e impotente, que os ratos estão roendo o dinheiro e é assaltado pela insônia*. Magnífico exemplo de romance social não naturalista, tudo ocorre em um clima nebuloso, como se houvesse um véu impedindo a percepção da realidade pela personagem, que não é protagonista de sua própria vida. Nesse sentido, a singularidade de Naziazeno se erige em símbolo: a da pobreza como alienação de si mesmo. Naziazeno não é sujeito de sua história, mas mero expectador: todos os seus dias são dias inglórios. 



* O narrador antecipa o simbolismo dos ratos, que ocupa os últimos capítulos do romance, primeiro como metáfora: são seus colegas de repartição "que se esgueiram, que se somem com pés de ratos" (p. 46).






Avaliação: OBRA-PRIMA  

(Novembro, 2016)


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