A paz dura pouco (1960)
Chinua Achebe (1930-2003) - NIGÉRIA
Tradução: Rubens Figueiredo
Chinua Achebe (1930-2003) - NIGÉRIA
Tradução: Rubens Figueiredo
São Paulo: Companhia das Letras, 2013, 194 páginas
Corre o ano de 1956. Obi Okonkwo, 25 anos, está de volta à Nigéria, após quatro anos estudando Inglês em Londres, financiado pela União Progressista de Umuofia, "vilarejo de língua ibo na Nigéria Oriental" (p. 13), cidade-natal do protagonista. Obi - de nome completo Obiajulu, "a mente afinal em repouso" (p. 15), criado no anglicanismo - é o primeiro cidadão de sua aldeia, situada a 800 quilômetros de Lagos, a capital, a conseguir um "'cargo europeu' no serviço público" (p. 16), ou seja, a tornar-se um funcionário civil de primeira classe, o que "basta para alçar um homem das massas para a elite" (p. 109), dando-lhe direito a apartamento funcional, adiantamento para a compra de um carro e salário mensal de 47,10 libras, valor equivalente ao que seus concidadãos levavam até um ano para ganhar. Entusiasmado com as perspectivas futuras e cheio de ideias progressistas, Obi luta para tornar-se uma cidadão exemplar, objetivando contrariar a visão dos colonizadores ingleses, que achavam que os africanos "ao longo de muitos séculos, foram vítimas do pior clima do mundo e de todas as doenças imagináveis", o que os deixou "moral e fisicamente solapados" (p. 12). Instalado no escritório da Comissão de Bolsas de Estudo, Obi tenta sobreviver com o pouco que lhe sobra após pagar a cota da dívida para com a União Progressista de Umuofia (20 libras) e a mandar dinheiro para os pais (10 libras). Pouco a pouco chegam as cobranças pelo seguro do carro, as cotas referentes ao imposto de renda, as novas despesas contraídas para manter as aparências de sujeito bem-sucedido... Para piorar, Obi descobre que sua família interpõe-se de maneira irredutível ao casamento com Clara Okeke, por conta de uma maldição que pesa sobre os Okeke, e aumenta ainda mais as dívidas para pagar seu aborto. Cada vez mais enredado, Obi Okonkwo acaba aceitando subornos, tanto em dinheiro quanto em sexo, inicialmente para resgatar débitos, depois por hábito, até ser afinal pego em flagrante delito... Maravilhoso romance sobre como a realidade dos países periféricos, submetidos à miséria e aos maus políticos, arrastam até os mais bem intencionados... Ou, usando as palavras do próprio protagonista: “A tragédia de verdade nunca se resolve. Prossegue para sempre sem esperança. A tragédia convencional é muito fácil. O herói morre e nós nos sentimos purgados de nossas emoções. Uma tragédia de verdade se passa numa esquina, num local sujo (...). O resto do mundo não tem consciência daquilo. (...) Não existe purgação das emoções para nós, porque não estamos lá" (p. 51-52).
(Novembro, 2018)
Avaliação: OBRA-PRIMA
Corre o ano de 1956. Obi Okonkwo, 25 anos, está de volta à Nigéria, após quatro anos estudando Inglês em Londres, financiado pela União Progressista de Umuofia, "vilarejo de língua ibo na Nigéria Oriental" (p. 13), cidade-natal do protagonista. Obi - de nome completo Obiajulu, "a mente afinal em repouso" (p. 15), criado no anglicanismo - é o primeiro cidadão de sua aldeia, situada a 800 quilômetros de Lagos, a capital, a conseguir um "'cargo europeu' no serviço público" (p. 16), ou seja, a tornar-se um funcionário civil de primeira classe, o que "basta para alçar um homem das massas para a elite" (p. 109), dando-lhe direito a apartamento funcional, adiantamento para a compra de um carro e salário mensal de 47,10 libras, valor equivalente ao que seus concidadãos levavam até um ano para ganhar. Entusiasmado com as perspectivas futuras e cheio de ideias progressistas, Obi luta para tornar-se uma cidadão exemplar, objetivando contrariar a visão dos colonizadores ingleses, que achavam que os africanos "ao longo de muitos séculos, foram vítimas do pior clima do mundo e de todas as doenças imagináveis", o que os deixou "moral e fisicamente solapados" (p. 12). Instalado no escritório da Comissão de Bolsas de Estudo, Obi tenta sobreviver com o pouco que lhe sobra após pagar a cota da dívida para com a União Progressista de Umuofia (20 libras) e a mandar dinheiro para os pais (10 libras). Pouco a pouco chegam as cobranças pelo seguro do carro, as cotas referentes ao imposto de renda, as novas despesas contraídas para manter as aparências de sujeito bem-sucedido... Para piorar, Obi descobre que sua família interpõe-se de maneira irredutível ao casamento com Clara Okeke, por conta de uma maldição que pesa sobre os Okeke, e aumenta ainda mais as dívidas para pagar seu aborto. Cada vez mais enredado, Obi Okonkwo acaba aceitando subornos, tanto em dinheiro quanto em sexo, inicialmente para resgatar débitos, depois por hábito, até ser afinal pego em flagrante delito... Maravilhoso romance sobre como a realidade dos países periféricos, submetidos à miséria e aos maus políticos, arrastam até os mais bem intencionados... Ou, usando as palavras do próprio protagonista: “A tragédia de verdade nunca se resolve. Prossegue para sempre sem esperança. A tragédia convencional é muito fácil. O herói morre e nós nos sentimos purgados de nossas emoções. Uma tragédia de verdade se passa numa esquina, num local sujo (...). O resto do mundo não tem consciência daquilo. (...) Não existe purgação das emoções para nós, porque não estamos lá" (p. 51-52).
(Novembro, 2018)
Avaliação: OBRA-PRIMA
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