O cocheiro da morte (1912)
Selma Lagerlöf (1858-1940) - SUÉCIA
Selma Lagerlöf (1858-1940) - SUÉCIA
Tradução: Maria de Fátima Lourenço Godinho
Lisboa: Estampa, 1975, 212 páginas
"Em breve virá a manhã do primeiro dia do ano, (...), e, ao acordarem, o primeiro pensamento dos homens será para o novo ano; pensarão em tudo o que esperam e desejam que este ano lhes traga e depois pensarão no futuro. E o que eu queria era poder aconselhá-los a não pedirem nem a felicidade do amor nem o sucesso, nem a riqueza ou a longa vida, nem sequer a saúde. Não, que se limitem a juntar as mãos e a concentrar as ideias num único pedido: 'Senhor, fazei com que a minha alma alcance a maturidade antes de ser ceifada'. (pág. 102)
Lisboa: Estampa, 1975, 212 páginas
Composto por oito narrativas, a mais longa, que empresta o título ao livro, "O cocheiro da morte", e mais sete contos breves, esta coletânea dá uma boa dimensão das preocupações da Autora. São histórias nascidas das lendas e mitos das terras geladas da Suécia, e que tratam, em substância, do tema mais relevante aos seres humanos: a morte. Denominada de "novelas fantásticas" pela editora, por permanecerem nos limiares da realidade, todas contam com um fundo moral (mas não moralizante), qual seja, a do profundo respeito pela vida, ou, em outras palavras, a consciência de que somos os únicos responsáveis pelo nosso destino. "O cocheiro da morte" parte da lenda de que a pessoa que morre no último minuto do último dia do ano substitui o auxiliar da Morte no trabalho de recolher as almas dos que irão falecendo ao longo do ano subsequente. Ocorre assim com David Holm, um bêbado, violento e debochado, que escarnece da tentativa de ajuda dos religiosos ligados ao Exército da Salvação. A irmã Edite, na hora de sua morte, pede para falar com David Holm, e seus companheiros de fé não compreendem o que ela, uma mulher pura e santa, teria para tratar com aquele mendigo rude e ignorante. Mal sabem que Edite, ao se aproximar dele, apaixonou-se, e pensando em fazer o bem, levando-o de volta para os braços da mulher e dos filhos, havia, na verdade, condenado a família à morte, pois ele, tuberculoso, por vingança e por maldade, tenta inoculá-los a sua doença. David, entretanto, morre, pouco depois de Edite, e é colocado como aprendiz do cocheiro da morte que, descobre, é um velho companheiro de farra. Ao longo daquele dia, que parecerá anos para David, ele assiste horrorizado as consequências das suas perversidades e, para corrigi-las, ganha uma segunda chance, regressando à vida. Uma comovente história de redenção, que, aliás, dá a tônica das outras narrativas. "A Lenda de Santa Lúcia" descreve um milagre patrocinado pela santa que nomeia a conto. "O tocador de violino" é o topos de alguém que é punido por zombar dos espíritos. "Sigrid, a soberba" mostra a quase danação do rei católico da Noruega, Olaf, que ia perdendo-se, encantando pela pagã rainha sueca, Sigrid. "A Saga de Reor" conta a história da união entre as raças dos humanos e dos gigantes. "A Velha Agneta" é uma linda história de uma mulher que vivia sozinha no alto da montanha e que encontra no consolo das almas condenadas ao gelo eterno o seu próprio consolo. "O 'Tomte' de Toreby" é uma magnífica fábula ecológica, e, finalmente, descobrimos que "O caminho entre o céu e a terra", ou seja, entre essa e a outra vida, é conduzido pela música... Um livro primoroso!
(Janeiro, 2018)
(Janeiro, 2018)
Avaliação: MUITO BOM
Entre aspas:
"Em breve virá a manhã do primeiro dia do ano, (...), e, ao acordarem, o primeiro pensamento dos homens será para o novo ano; pensarão em tudo o que esperam e desejam que este ano lhes traga e depois pensarão no futuro. E o que eu queria era poder aconselhá-los a não pedirem nem a felicidade do amor nem o sucesso, nem a riqueza ou a longa vida, nem sequer a saúde. Não, que se limitem a juntar as mãos e a concentrar as ideias num único pedido: 'Senhor, fazei com que a minha alma alcance a maturidade antes de ser ceifada'. (pág. 102)
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