O Conde de Monte Cristo (1844-1846)
Alexandre Dumas (1802-1870) - França
Tradução: André Telles e Rodrigo Lacerda
Rio de Janeiro: Zahar, 2016, 1.371 páginas
Eis um livro em tudo grandioso: suas quase 1.400 páginas arquitetam a mais terrível história de vingança da literatura universal. Alicerçado em procedimentos estéticos românticos (personagens disfarçados, tesouros fabulosos, coincidências inverossímeis), oferece uma crítica contundente à sociedade por meio de um herói mitômano, cruel, amoral e blasfêmico. Edmond Dantès é um marujo de 19 anos, honesto e trabalhador, que ama o pai e ama a catalã Mercedes, com quem prepara-se para casar. Ao voltar de uma viagem de rotina, comandando um veleiro pertencente à firma Morrel & Filho, ele porta, em segredo, uma carta de Napoleão Bonaparte, então exilado na ilha de Elba, a pedido do capitão do navio, morto em alto mar, sem fazer ideia do que isso representa. Incentivado pelo invejoso contador Danglars, o catalão Fernand, que também ama Mercedes, entrega uma denúncia anônima ao procurador substituto do rei em Marselha, De Villefort, que descobre, em breve interrogatório, o conteúdo subversivo da correspondência que tem como destinatário seu pai, em Paris. Para não correr riscos de ver a carreira maculada, ele queima a carta e manda encarcerar para sempre Dantès nas masmorras do castelo de If, como perigoso bonapartista. Lá, enterrado vivo, passa 14 anos - nove em solidão absoluta e os últimos cinco na companhia do abade Faria, que, na iminência da morte, lhe entrega o mapa de um tesouro escondido na ilha de Monte Cristo. Dantès consegue fugir da prisão e apodera-se de riquezas incomensuráveis. Quando volta a Marselha descobre que o pai morreu de fome e que seus desafetos, por uma série de peripécias, enriqueceram-se e se mudaram para Paris: Danglars, banqueiro, agora Barão de Danglars; De Villefort, alçado a procurador geral do rei; e Fernand, casado com Mercedes, instituídos em Conde e Condessa de Morcerf*. Então, cego de ódio, Dantès, o Conde de Monte Cristo, num arroubo de mitomania e blasfêmia, declara: "Tomei o lugar da Providência para recompensar os bons... que o Deus vingador me ceda o seu para punir os maus!" (p. 341). Os nove anos e meio seguintes serão dedicados a planejar, com um rigor doentio, a perdição de seus inimigos, executada em apenas seis meses. Rancoroso - "(...) nunca me preocupo com o próximo, nunca tento proteger a sociedade que não me protege, e digo mais, que geralmente só se preocupa comigo para me prejudicar (...)" p. 514 - e implacável - "(...) não sou eu que golpeia, é a Providência" p. 1.069 - cria ciladas, promove mentiras, esmaga um a um aqueles que roubaram seu passado. Articula a bancarrota de Danglars e humilha sua mulher, poupando-lhes somente a filha, Eugénie**. Instiga Heloïse, casada em segundas núpcias com De Villefort, a envenenar o ex-sogro e a ex-sogra do marido e de tentar envenenar o sogro - acaba matando seu fiel empregado - e a enteada Valentine, e, quando descoberta, envenena o filho e se mata, enlouquecendo o procurador do rei. Arma o filho bastardo de De Villerfort com a Baronesa de Danglars, Benedetto, para assassinar Caderousse, que considera também responsável pela morte de seu pai. Leva Fernand ao suicídio, reduzindo à miséria a ex-amada, Mercedes, e seu filho, Albert. Em sua missão de "extirpar o mal" (p. 1.301), em momento algum Dantès sente remorso, pois considera-se um "(...) emissário de Deus (...)" p. 1.089. Os únicos preservados da fúria são seus serviçais e os filhos do seu ex-patrão, Morrel, Julie e Maximilien, e Haydée, uma personagem importante, mas secundária, com quem afinal se casa para, talvez, viver feliz pelo resto de seus dias.
* É interesse observar que as riquezas de Danglars e Fernand são usurpadas - o que, de certa forma, corrobora a tese do contemporâneo, Honoré de Balzac (1799-1850), que, em A estalagem vermelha (1831), escreveu: "Por detrás de toda grande fortuna há um crime".
** Ousado e moderno, Dumas coloca em ação um casal homossexual feminino, Eugénie Danglars e a srta. d'Armilly, em fuga para a Bélgica: "Então, com uma presteza que indicava não ser a primeira vez que se disfarçava com roupas do outro sexo, Eugénie calçou suas botinas, enfiou uma calça comprida, deu um laço na gravata, abotoou até o pescoço um colete com colarinho e rematou com um redingote que desenhava sua cintura fina e redonda" (p. 1.151)
Avaliação: OBRA-PRIMA
(Agosto, 2016)
Entre aspas
"(...) a felicidade cega ainda mais que o orgulho". (p. 54)
"Em política (...) não existem homens, mas ideias; sentimentos, mas interesses; em política, ninguém mata um homem: suprime-se um obstáculo (...)". (p. 137)
"Aprender não é saber; há sabidos e sábios; é a memória que faz os primeiros, é a filosofia que faz os outros". (p. 201)
"(...) para seu pessoal, o senhor é fidalgo; para os jornalistas, senhor; para os eleitores, cidadão. São nuances que combinam bem com o governo constitucional". (p. 588)
"(...) peço permissão para mostrar minha galeria: toda ela de quadros antigos, todos quadros de mestres autenticados como tais; não gosto dos modernos.
- Tem razão, senhor, pois eles têm um grande defeito: o de ainda não terem tido tempo de se tornarem antigos". (p. 591)
"A sua história é um romance, e a sociedade, que adora os romances espremidos entre duas capas de papelão, desconfia estranhamente daqueles que vê encapados num pergaminho vivo, ainda que dourado (...)". (p. 696)
"As feridas morais têm essa particularidade: elas se escondem, mas não se fecham. Sempre dolorosas, prontas a sangrar quando tocadas, elas permanecem vivas e abertas no coração". (p. 1.040)
"(...) a vida é um eterno naufrágio de nossas esperanças (...)" (p. 1.130)
"É onde se foi feliz que se deve morrer". (p. 1.305)
"Este é um dos orgulhos da nossa funesta humanidade: cada homem julga-se mais infeliz que outro infeliz que chora e geme ao seu lado". (p. 1.319)
"(...) não existe nem felicidade nem infelicidade neste mundo, mas a comparação de uma com a outra". (p. 1.265)
"Esperar é ter esperança" (p. 1.366)
"Em política (...) não existem homens, mas ideias; sentimentos, mas interesses; em política, ninguém mata um homem: suprime-se um obstáculo (...)". (p. 137)
"Aprender não é saber; há sabidos e sábios; é a memória que faz os primeiros, é a filosofia que faz os outros". (p. 201)
"(...) para seu pessoal, o senhor é fidalgo; para os jornalistas, senhor; para os eleitores, cidadão. São nuances que combinam bem com o governo constitucional". (p. 588)
"(...) peço permissão para mostrar minha galeria: toda ela de quadros antigos, todos quadros de mestres autenticados como tais; não gosto dos modernos.
- Tem razão, senhor, pois eles têm um grande defeito: o de ainda não terem tido tempo de se tornarem antigos". (p. 591)
"A sua história é um romance, e a sociedade, que adora os romances espremidos entre duas capas de papelão, desconfia estranhamente daqueles que vê encapados num pergaminho vivo, ainda que dourado (...)". (p. 696)
"As feridas morais têm essa particularidade: elas se escondem, mas não se fecham. Sempre dolorosas, prontas a sangrar quando tocadas, elas permanecem vivas e abertas no coração". (p. 1.040)
"(...) a vida é um eterno naufrágio de nossas esperanças (...)" (p. 1.130)
"É onde se foi feliz que se deve morrer". (p. 1.305)
"Este é um dos orgulhos da nossa funesta humanidade: cada homem julga-se mais infeliz que outro infeliz que chora e geme ao seu lado". (p. 1.319)
"(...) não existe nem felicidade nem infelicidade neste mundo, mas a comparação de uma com a outra". (p. 1.265)
"Esperar é ter esperança" (p. 1.366)
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