sábado, 3 de outubro de 2020

    Biblioteca do Século XXI (1986)

Stanislaw Lem (1921-2006) - POLÔNIA 

Tradução: Teresa Brito 

Lisboa: Estampa, s/d, 156 páginas



Trata-se de pseudo-resenhas sobre três livros inexistentes: "Um minuto da Humanidade", "Sistemas de armamentos do Século XXI, ou A evolução de pernas para o ar" e "O princípio do cataclismo criador, ou O mundo como holocausto". De novo: esqueça o subtítulo "Novelas fantásticas" que acompanha a capa, pois os textos não são novelas e muito menos novelas fantásticas. O Autor, aliás, explica, melhor que ninguém, de forma brilhantemente irônica, o seu propósito: "A maneira mais segura de manter secreta uma ideia insólita mas perfeitamente autêntica é expô-la tal como ela é, e publicar este resumo sob a máscara de uma obra de ficção científica. Da mesma forma que um diamante atirado para um monte de vidro partido se torna invisível, uma autêntica revelação metida entre tolices de literatura fantástica passa despercebida; acaba por se lhe assemelhar, deixando de ser perigosa" (p. 64-65). E o livro é exatamente isso: sob a capa de um narrador que está simplesmente resenhando livros publicados no Século XXI, o Autor desenvolve uma série de reflexões, instigantes por sinal, a respeito da banalidade que se transformou a trágica vida humana na Terra, sobre a estupidez da corrida armamentista, sobre a importância do acaso na origem da vida na Terra. São formulação geniais e profundas, em que sua impressionante erudição não se manifesta em pedantismo, mas em simplicidade. Como, por exemplo, a respeito do arsenal nuclear: "(...) ninguém pode obter uma supremacia militar absoluta. Se é permitido exprimir-mo-nos assim, torna-se impossível distinguir o sucesso do desastre. Numa palavra: a corrida aos armamentos só pode levar a uma vitória à Pirro" (p. 75). Ou esta, trágica e arguta, de que, no Universo, a criação se dá pela destruição - tese que desenvolve na última "resenha": "(...) o mundo é uma série de catástrofes fortuitas regidas por leis rigorosas" (p. 137) ou que "as leis da natureza não agem apesar do acaso, mas através dele" (´p. 154). Um livro necessário e absolutamente contemporâneo numa época em que a "lei de Lem" reina: "ninguém lê o que quer que seja; aquele que apesar de tudo lê não percebe nada; e se percebe depressa trata de esquecer" (p. 10).


AVALIAÇÃO: MUITO BOM

(Outubro, 2020)

 

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